A morte não é a maior perda da vida. A maior perda é o que morre dentro de nós enquanto vivemos*




 Dia terrível....

Fim de semana terrível....

Mês terrível....

Ano demasiadamente terrível.


A gente sabe que tem ano que dói mais que o normal pra fluir. São razões inexplicáveis, algo quase esotérico. Tenho certeza que se algum estatístico pegasse os dados pela mão e fizessem as contas, concluiria que esse ano foi tão ruim (ou bom) quanto qualquer outro, em termos de mortes, inflação, fome, deficit de tantas coisas que temos assistido boquiabertos acontecer e piorar a cada dia.

Mas sou testemunha que fatos e dados não contam muito nessa hora. Quando a gente sente o dia pesando, ou o mês, o ano, nada nos fará sentir diferente. E 2021 está sendo Esse ano.

Certo é que certas perdas nos afetam mais que outras, mas mais certo ainda é que cada vez que uma dessas acontece, todas as outras ficam pairando novamente sobre nossos ombros, como se estivessem acabado de acontecer.

E o fardo vai ficando bem pesado. Tão pesado que muitas vezes ficamos apáticos diante dessas coisas. Um avião que cai matando uma jovem cantora em pleno auge. Perder 3 colegas de trabalho de forma abrupta e sem sentido (sim, hoje perdemais mais um, de Covid, dessa vez, para mal dos pecados). Passar pelo luto de 2 familiares muito amados (neste ano, se for contar o ano passado a conta sobe). São coisas que vão se emaranhando em nossas entranhas, de um jeito quase indissolúvel. E tudo isso paira sobre nossas cabeças, como uma nuvem..

E sim, lógico que tem muita gente passando coisa pior por ai. Mas isso também não nos autoriza a NÃO sentir qualquer dor. A não me sentir enlutada por mim e por tantos que estão por ai sofrendo, ainda agora, com mortes de hoje, de ontem, de todos esses 2 anos de pandemia louca.

Sim, pandemia louca. Já pararam para refletir sobre o que foi a gente, do nada, ter que se trancar em casa e não poder mais fazer absolutamente nada do que fazíamos há tantos anos!?

Nem um velório, já que estamos falando de perdas, a gente teve o direito de fazer. E ai fica essa sensação esquisita que aqueles que partiram nunca foram embora de fato. Que a qualquer momento, vou sair de casa e me deparar com meu pai, falando alto e tomando um cafezinho preto frio. Meu amigo Marcão, nos chamando pra uma macarronada ou tomando boldo direto do meu pé no quintal. Meu primo Leo, ajudando a organizar o almoço dos raros. E minha tia Nanci, essa então, nem dá pra contar cada vez que penso que vou dar de cara com ela, na minha porta, na casa da minha mãe, enfim, em todos os lugares. E ela teve velório. Isso sem entrar no mérito de 3 colegas de trabalho, antigos, que quando entrei na Procuradoria, lá "pelos idos" de 2 de fevereiro de 1998, já lá se encontravam (Antonio Wenceslau e Jacqueline) ou chegaram pouco depois (Sérgio Tabô).

A gente nem tem noção direito de tudo isso que passou e como está impactando agora no nosso ser e ainda impactará por um milhão de anos.

Enfim, é muita areia pro meu caminhãozinho, bicho.

Agora já estamos todos com um pé na casca e outro na banana. Retomando as atividades aos poucos, metendo a cara na rua, mas sempre com aquela tensãozinha de leve de quem, mesmo vacinado, está vendo ainda gente morrer de Covid. De desastre de avião, de câncer. 

Voltar agora é mais que necessário. Sempre com cuidado. Mas precisamos sentir a realidade do mundo aos nossos pés. Os cheiros e sabores do cotidiano de nossas vidas. Sentir mesmo tudo o que acontece, de bom e de ruim.

Antes que fiquemos inevitavelmente fóbicos (alguns de nós, certeza que já estão).

E isso é morrer em vida. O que é inaceitável ao meu ver, além de extremamente cafona.

Viver não tem preço. A gente sabe que a morte se contrapõe à vida até como forma de nos fazer sentir a importância de tudo isso que temos ao alcance da mão e nem sempre conseguimos enxergar.

Mas que não é fácil, não é, como diria Safo de Lesbo:

"Se a morte fosse um bem, os deuses não seriam imortais."

Nós somos.

Mas enquanto isso, vamos vivendo da melhor maneira!









*Norman Cousins







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